24 Janeiro 2019
“2019 se apresenta como o ano no qual muitas das ‘batalhas’ do pontífice argentino de 82 anos, que está realizando uma reforma da Igreja, chegarão a uma conclusão. Sua esperança é que muitos nós possam finalmente se desfazer”, escreve Domenico Agasso Jr., em artigo publicado no Vatican Insider, 22-01-2019. A tradução é de Graziela Wolfart.
O Papa Francisco inicia em “sua” América Latina o período decisivo do pontificado. Vai ao Panamá para se encontrar com os jovens da Jornada Mundial da Juventude, mas também para iniciar uma reflexão sobre os temas da Amazônia – defesa dos indígenas e do meio ambiente, sobretudo – em vista do Sínodo especial de outubro. É um entre tantos desafios complicados que estão a ponto de chegar em sua fase decisiva. 2019 se apresenta como o ano no qual muitas das “batalhas” do pontífice argentino de 82 anos, que está realizando uma reforma da Igreja, chegarão a uma conclusão. Sua esperança é que muitos nós possam finalmente se desfazer.
Entre aqueles que seguem a atualidade vaticana existe a sensação de que o encontro de fevereiro poderá se converter em um verdadeiro evento-símbolo deste pontificado. Talvez mais: uma mudança decisiva para o futuro da Igreja.
Também por este motivo, além dos muros vaticanos, se adverte especialmente a pressão, sobretudo dos Estados Unidos. Existe uma expectativa midiática planetária porque, conforme dizem, serão os dias em que a Igreja “terá sua credibilidade posta em cheque”. A Santa Sé garantiu resultados concretos e consciência. Junto com a clareza. Assim, o flagelo dos abusos e da pedofilia na Igreja será abordado no encontro sobre a proteção de menores e adultos vulneráveis, programado para acontecer de 21 a 24 de fevereiro, do qual participarão os presidentes das conferências episcopais de todo o mundo. O objetivo é assegurar que cada bispo possa regressar a seu país sabendo bem “o que deve ser feito” para enfrentar estes crimes.
Mesmo que no último dia 17 de dezembro tenha completado 82 anos, em 2019 o Bispo de Roma tem numerosas viagens programadas. Começando pelos primeiros meses: Panamá, Emirados Árabes Unidos, Marrocos, Bulgária, Antiga República Iugoslava de Macedônia. É um programa muito intenso, em uma síntese dos aspectos “mais quentes” da situação atual da Igreja universal e da humanidade. E provavelmente Francisco acrescentará outras viagens internacionais: por exemplo, no ano passado anunciou seu desejo de visitar o Japão.
De 23 a 28 de janeiro acontece a visita ao Panamá, em função da 34ª edição da Jornada Mundial da Juventude. Evento que vem depois do Sínodo dos bispos de outubro passado, que propôs reviver o protagonismo dos jovens na Igreja. E justamente no que se refere aos jovens, domingo passado o Papa lançou um aplicativo, Click To Pray. É um instrumento “para rezar juntos”. Funciona assim: está em um site, em aplicativos móveis e redes sociais, em seis idiomas. E tem três seções: “Reza com o Papa” com as intenções mensais do Pontífice; “Reza todos os dias” para facilitar a oração três vezes por dia; “Reza em rede”, que é um espaço onde os usuários podem compartilhar suas orações e orar uns pelos outros. Podem ver quem reza, por que e quantos estão orando.
O novo aplicativo é um gesto para estar ainda mais próximo dos jovens. Mas cuidado, Panamá também quer dizer que o Papa argentino regressa à América Latina, onde está o tema da Amazônia e dos nativos: é por isso que nos dias panamenhos, se olhará para outubro, para o Sínodo sobre a Amazônia onde se apresentará a proposta do viri probati, ou seja, a ordenação de homens mais velhos, casados e de fé comprovada como sacerdotes. Não significa que haverá uma abertura ao matrimônio dos sacerdotes, assinalam nos Palácios Sagrados, mas que poderão celebrar os sacramentos nas áreas aonde um sacerdote chega uma vez por ano. O celibato dos sacerdotes seguirá tal qual é hoje. No Sínodo se abordarão, sobretudo, as questões ecológicas difíceis do liberalismo selvagem, da “economia que mata”, da defesa dos povos indígenas e do meio ambiente.
De 3 a 5 de fevereiro o Papa irá para os Emirados Árabes Unidos, como o primeiro Pontífice a chegar naquele país. O lema da visita é “Faz-me canal de tua paz”. No centro do evento, a importância do diálogo inter-religioso e a fraternidade entre os crentes de diferentes religiões. 2019 foi declarado pelas autoridades dos Emirados Árabes Unidos como o “Ano da tolerância”, com o objetivo de promover uma cultura afastada do fundamentalismo.
Em 30 e 31 de março Francisco estará no Marrocos, seguindo os passos da histórica visita feita há 33 anos pelo Papa São João Paulo II: em 19 de agosto de 1985, Wojtyla encontrou 80.000 jovens muçulmanos no estádio de Casablanca. Um evento histórico para o diálogo entre o cristianismo e o Islã. O Papa polaco afirmou em seu famoso discurso que “o diálogo entre cristãos e muçulmanos hoje em dia é mais necessário do que nunca”, sem descuidar “as diferenças importantes”, como também “as muitas coisas em comum”. João Paulo II havia declarado: “Cristãos e muçulmanos, em geral, não nos entendemos e, às vezes, no passado, nos enfrentamos e inclusive nos perdemos em polêmicas e guerras. Creio que Deus nos convida hoje a mudar nossos velhos hábitos. Devemos respeitar a nós mesmos”, também porque “cremos no mesmo Deus”. O Papa polaco falou sobre os direitos humanos, que “têm seu fundamento em Deus”. E fez um apelo à paz e à justiça para vencer as tentações de quem quer “mudar tudo com violência ou soluções extremas”, porque o preço da violência recai sempre sobre os inocentes.
O logotipo da visita de Francisco tem uma cruz e uma meia lua, para salientar o caráter inter-religioso entre cristãos e muçulmanos. Representa o diálogo desejado pelo papa Wojtyla e que agora o papa Francisco tenta levar adiante com força. O intuito é eliminar as bases da instrumentalização da religião através do ódio e da violência, derrotando, assim, o terrorismo e as guerras.
De 5 a 7 de maio Bergoglio estará na Bulgária e na Antiga República Iugoslava de Macedônia. Os católicos nestes dois países são uma minoria em meio aos ortodoxos. A viagem se centra no diálogo com o mundo ortodoxo em um momento difícil para estas Igrejas orientais, depois do nascimento da nova Igreja autônoma ortodoxa ucraniana, reconhecida pelo Patriarcado Ecumênico de Constantinopla, mas não pela ortodoxa russa.
De 31 de maio a 2 de junho, o Papa enfrentará outra viagem de dimensão ecumênica. Irá à Romênia para promover a unidade de todos os cristãos sob o manto de Nossa Senhora.
A crise atual dos abusos no clero é utilizada pelos opositores do Papa como uma plataforma para expulsar Francisco do papado e eleger um novo pontífice que se adapte melhor a suas agendas. Isso foi dito nos últimos dias pelo cardeal alemão Walter Kasper, presidente emérito do Conselho Pontifício para a Promoção da Unidade dos Cristãos e um teólogo muito estimado por Bergoglio. “Há pessoas, disse Kasper, em uma entrevista ao programa de TV Report München, transmitido pela emissora estatal alemã Ard e reproduzida por Crux, que simplesmente não gostam deste pontificado. Querem que termine o quanto antes para depois, desta maneira, haver um novo conclave”. Querem que vá “a seu favor, assim terá um resultado que se adapte a suas ideias”. Kasper argumentou que há alguns grupos na Igreja que estão se aproveitando da crise de abuso como plataforma para a expulsão de Francisco do papado. Em sua entrevista à Ard, Kasper disse que os adversários papais estão utilizando uma estratégia “inapropriada” para converter a discussão sobre o tema dos abusos “em uma discussão sobre o Papa Francisco” que, segundo ele, equivale a um “abuso de abusos”.
Não podemos esquecer a organização midiática por meio da qual foi publicada a solicitação de demissão do Papa, em uma carta de 26 de agosto de 2018, veiculada no último dia da viagem de Bergoglio a Dublin, do ex-núncio nos Estados Unidos, Carlo Maria Viganò, que acusou Francisco de ter ignorado as acusações de má conduta contra o ex-cardeal Theodore McCarrick.
O caso de McCarrick, ex-arcebispo de Newark e depois de Washington, explodiu em junho quando uma investigação interna da Igreja definiu como plausíveis as acusações de assédio de um antigo coroinha na década de 1970. Apesar das negações do sumo sacerdote, o escândalo havia criado uma nova crise para a Igreja estadunidense e as próprias hierarquias do Vaticano, já que aparentemente não era um segredo que o “Tio Ted”, como ele mesmo se chamava, tinha relações sexuais com seminaristas adultos.
Depois da publicação das acusações sobre a conduta de McCarrick, em 28 de julho, o Papa Francisco lhe tirou o barrete cardinalício e “ordenou sua suspensão do exercício de qualquer ministério público, junto com a obrigação de permanecer em uma casa” para conduzir “uma vida de oração e penitência” à espera do resultado do processo canônico.
De 18 a 20 de fevereiro será celebrada no Vaticano a 28ª reunião do Conselho de Cardeais. É esperada a nova Constituição apostólica, que reforme e modernize a cúria romana. Entre outras coisas, o Conselho de Cardeais já não é C9: agora são seis os membros do Conselho de cardeais que começou em 2013 por vontade do Papa Bergoglio, que necessitava um organismo que o ajudasse no trabalho de reforma da Cúria romana e no governo da Igreja. Abandonaram recentemente o Conselho o cardeal australiano George Pell (77), o chileno Francisco Xavier Errazuriz (85) e o congolês Laurent Monswengo Pasinya (78); os três superam a idade canônica de “jubilação” dos 75 anos de idade, mas também passam por situações complicadas.
Deveria mudar o prefeito da Secretaria Econômica, o próprio George Pell, que está a ponto de terminar seu período de cinco anos, e tem 77 anos. Isto independentemente de como acabar o processo judicial. De fato, Pell está sendo julgado desde 2017 em um tribunal de Melbourne, Austrália, acusado por abuso sexual.
Entre 2018 e 2019, mudanças drásticas caracterizaram as comunicações vaticanas. Em dezembro, Andrea Tornielli foi nomeado como diretor dos meios do Vaticano e Andrea Monda, diretor do L’Osservatore Romano. Depois da renúncia de Greg Burke como diretor da Sala de Imprensa da Santa Sé, e da subdiretora Paloma García Ovejero, Alessandro Gisotti foi escolhido em janeiro como diretor interino da Sala de Imprensa. Agora, a máquina da comunicação está funcionando bem, como confirmam muitos especialistas: se percebe um acordo na organização e um grande entendimento entre Tornielli, Gisotti e o prefeito do Dicastério para a Comunicação, Paolo Ruffini. Parece que entre os próximos passos que a nova administração está preparando está a volta de um papel de maior visibilidade da Rádio Vaticana.
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Francisco no Panamá: começa o ano crucial do pontificado - Instituto Humanitas Unisinos - IHU